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A Câmara Municipal de Araraquara, atendendo Requerimento (274/2021), de autoria dos vereadores Thainara Faria (PT) e Guilherme Bianco (PCdoB) realizou na sexta-feira (10), audiência pública com o tema “Pela Democracia: Ditadura nunca mais”. O presidente da Câmara, vereador Aluisio Boi (MDB), e a vereadora Fabi Virgílio (PT) também participaram, juntamente com os convidados o cientista social Bruno Souza Silva, a cientista política Amanda Vizoná, a vereadora em Salvador Maria Marighella, e o professor doutor Pietro de Jesús Lora Alarcón.
Bianco, que é cientista social, justificou a audiência como necessidade de se discutir o momento vivido pelo país. “A gente vive uma onda de violência, com ataques quase diários ao estado democrático de direito, à liberdade de imprensa e à liberdade de organização, uma crise institucional, política, econômica e social. “Envolto em tudo isso estamos em meio a uma das maiores crises sociais, institucionais e sociais de sua história, tentando colocar em risco a democracia e o estado democrático de direito."
Thainara, vice-presidente da Câmara, lembrou que nas ruas, nas redes sociais e até nas sessões da Casa de Leis, tem havido um crescimento no discurso fascista, tentando apagar o que realmente aconteceu em 1964. “Tentam apagar a realidade de que pessoas foram torturadas; apagar a perseguição, tortura e morte de pessoas que estavam na resistência, que lutaram pela democracia, pessoas que garantiram que hoje todos nós possamos, livremente, expressar nossos conhecimentos, ideias e tudo aquilo que sentimos e pensamos. A democracia é belíssima e não pode ser atacada nunca mais."
O vereador Aluisio Boi falou que a democracia tem compromisso com a transparência e a informação correta. “Pessoas morreram no passado para garantir a nossa liberdade de expressão hoje; a nossa liberdade de pensamento e respeito que a democracia prega. Tem gente tentando fazer as pessoas acreditarem que não houve golpe, que não houve ditadura. A primeira coisa na ditadura é fechar o parlamento e a imprensa. O que representa o povo é o parlamento e a imprensa. Não podemos perder os valores construídos lá atrás, quando reconquistamos a democracia e a nossa constituição. Não podemos ver jornalistas e até políticos pregando o fim da democracia, dentro de uma casa de leis. A casa de lei fecha na ditadura e o povo perde a voz. A nossa missão é defender a constituição e a democracia. Descumprir a constituição é destruir a pátria”, citando Ulisses Guimarães na promulgação da constituição, em 1988. Estamos vendo destruidores da pátria, vestindo verde e amarelo, enrolado na bandeira. A democracia é o que nos fortalece enquanto cidadãos”, concluiu.
Amanda Vizoná, bacharel, mestre e doutora em Ciência Política e secretária municipal de Direitos Humanos e Participação Popular, também destacou a importância do respeito à história. “Se a gente não relembrar a história, mesmo os seus momentos mais tristes, ela pode voltar e voltar muito pior. A ditadura fez inúmeras vítimas, estuprou mulheres, matou estudantes, matou pais, mães; deixando órfãos da ditadura; matou filhos e filhas, matou estudantes; quantas sofreram a morte de seus filhos pela ditadura e muitas vezes nem puderam velar seus corpos porque eles desapareceram. Nossa democracia ainda é jovem, muito recente, mas já tem gente, novamente, tentando acabar com ela. Não podemos aceitar nenhum tipo de retrocesso ou retirada de direitos. Tem gente que sai por aí comemorando algo que levou a morte de pessoas e buscando mais mortes ainda. Vamos resistir. Ditadura nunca mais”, disse Amanda.
Bruno Souza da Silva, cientista Social, doutorando em Ciência Política, professor, colunista e escritor, seguiu a mesma linha de pensamento e foi além. “Quem tem minimamente uma consciência histórica sabe o quanto é importante defender a democracia e combater a ditadura e essa cultura autoritária. O que nos deveria unir como nação é a defesa irrestrita em relação à democracia. Você defender tortura, defender torturador, defender qualquer ato de fechamento de imprensa, de fechamento do parlamento é, acima de tudo, um ato antidemocrático. E isso é um profundo desconhecimento. Você tem que ter tolerância, empatia, respeitar o seu opositor sem desqualificá-lo e ameaçá-lo”. Silva lembrou ainda onde a democracia verdadeira acontece e é praticada. “O papel do legislativo é extremamente central no histórico de construção da democracia. Nos momentos mais autoritários da história do país sempre foi a instituição mais atacada, sendo fechado diversas vezes, porque é o poder mais próximo do povo e o representa. Precisamos entender que sim, houve uma ditadura e as pessoas que tentam mudar a história, o fazem porque não tiveram entes queridos que foram assinados, mortos e torturados pela ditadura. É preciso preservar viva a nossa memória e a nossa história para que a gente não cometa os mesmos erros que foram cometidos lá atrás”, lembrou o cientista social.
Maria Marighella, vereadora em Salvador, neta de Carlos Marighella, um dos principais líderes da luta contra a ditadura militar, morto em 1969 por agentes responsáveis pela repressão a adversários políticos do regime, também participou da audiência e falou do respeito que é preciso ter pela história. “Um país que não trata a verdade como valor de democracia, ele acaba por ser vítima da sua própria ausência de memória”. Ela fez, ainda, um histórico sobre sua família e os impactos das perseguições, torturas e morte de seu avô, que lutava pela democracia, num momento em que o país vivia ausência de direitos sob o regime militar, na ditadura a partir do golpe de 1964. “Nós ainda temos muitas heranças de períodos autoritários e enquanto não houver justiça, nós ainda estaremos atravessados por esses fantasmas que insistem em nos perseguir”, concluiu.
O colombiano Pietro de Jesús Lora Alarcón, professor graduado, mestre e doutor em Direito no Brasil, Colômbia e Uruguai, destacou as agressões que se fazem à democracia neste momento no Brasil. “Estão impedindo a juventude de aprender o que é democracia do ponto de vista técnico e do ponto de vista ético. E se tenta fazer isso a partir de projetos, como a escola sem partido e a partir de agressões, como o presidente da República faz contra a educação pública e como tenta interferir na autonomia universitária. É na universidade que se faz ciência, onde se faz reflexão crítica. Isso é antidemocrático e interessa única e exclusivamente a quem tem medo das iniciativas populares e na construção da liberdade e da igualdade dos cidadãos”.
Fabi lembrou fatos registrados pela história, sobre a ditadura, como os 1.049 sacos com ossos humanos encontrados no cemitério clandestino de Perus-SP. “Muitas mães ainda não enterraram seus filhos mortos pelo regime militar por não ter corpos. Houve fechamento de Congresso, houve tortura, fecharam teatros, prenderam artistas, censuraram a arte em suas viersas linguagens, prenderam estudantes, assassinaram inocentes, invadiram universidades, exilaram pessoas e isso não é mentira, é história. Um país que nega a sua história e se socorre de fatos falsos, mentirosos, para tentar reescrevê-la, está fadado a jamais se desenvolver e será incapaz de seguir seu caminho. A aqueles que assim agem, não passam de traidores e usurpadores da pátria. O compromisso desta Câmara é com a democracia”. Fabi citou ainda o poeta alemão Bertolt Brecht. “Que tempos são esses em que temos que defender o óbvio”.
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