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Somente no mês de março deste ano, foram notificados quatro casos de suicídio em Araraquara. Entre tentativas e fatos concretos, o fenômeno vem se intensificando na cidade nos últimos anos. Por isso, na última quinta-feira (23), o Plenário de Câmara Municipal foi palco de uma discussão sobre o tema durante a Audiência Pública “Precisamos falar sobre suicídio”, solicitada pela vereadora Luna Meyer (MDB), com o objetivo de debater prevenção, ações e equipamentos de saúde envolvidos no enfrentamento ao problema.
“No mundo, a cada 40 segundos, alguém tira a própria vida. Mais de 700 mil pessoas morrem de suicídio a cada ano. São números que representam uma epidemia silenciosa”, apontou Luna ao abrir a audiência. “No Brasil, a situação é ainda mais preocupante, porque, em 2022, registramos um suicídio a cada 45 minutos [dados da Fiocruz, OMS e Ministério da Saúde]. Entre 2019 e 2022, houve um aumento de 3% nos casos de suicídio no Brasil. Na maioria dos países, os casos começaram a regredir depois que passou a pandemia, mas no Brasil eles estão ainda aumentando por razões que precisam ser identificadas”, completou.
Um dos focos do evento foi destacar os serviços que a população tem à disposição para lidar com questões de saúde mental, de equipamentos da rede de saúde, a instituições, passando pela Guarda Civil Municipal, Corpo de Bombeiros e universidades.
A secretária municipal da Saúde, Eliana Honain, não pôde participar da audiência, mas enviou um vídeo para exibição, no qual afirmou que “o suicídio precisa ser discutido entre todos os setores e políticas públicas de Araraquara”. “Não é um motivo único que leva as pessoas a um ato tão derradeiro quanto tirar a própria vida. Todas as secretarias precisam trabalhar juntas, porque muitos motivos levam a isso, e temos de ter sensibilidade, nos nossos serviços, para poder identificar pessoas que estão em potencial risco de suicídio.” Eliana também destacou a importância da capacitação das equipes de servidores para identificar, encaminhar e acompanhar pessoas que apresentam tal risco.
Nesse mesmo sentido, o coordenador executivo de Assistência Especializada, Misael Henrique Emilio, observou que “o comprometimento da sociedade, da família, dos vários setores é o que molda, de fato, a saúde mental. É assim que se trabalha a prevenção, nas múltiplas formas que ela pode ser ofertada”. Misael explicou que a rede de saúde mental depende muito da Atenção Básica – Unidade Básica de Saúde, Programa de Saúde da Família, Consultório na Rua e Centro de Convivência. “Eles são o primeiro acolhimento, são a porta de entrada para o serviço, é importante reforçar com a população: o posto de saúde é a primeira entrada para os pacientes hoje, principalmente para os pacientes com transtorno de humor”, enfatizou.
O coordenador indicou os serviços de pronto-atendimento para os casos emergenciais, em que o paciente está em situação crítica e precisando ser estabilizado, no caso, as três Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu). Além disso, o Município tem à disposição os serviços especializados. “Nos esforçamos muito para que essa rede, de fato, seja completa, que ela consiga atender, em toda a sua amplitude, o cuidado da pessoa humana.” Ainda segundo Misael, as principais demandas atendidas na rede, no pós-pandemia, são questões sociais, conflitos familiares e questões de trabalho e renda que culminam em depressão, ansiedade e crises de pânico.
A gerente de Saúde Mental, Gislaine Oliveira Martins, apresentou as quatro unidades que trabalham a questão, reforçando que, no que diz respeito a saúde mental e suicídio, o trabalho não pode se limitar às unidades de saúde mental. “Quando se trata de saúde mental, a gente coloca toda a rede, porque juntos fazemos a diferença. Não conseguimos cuidar das pessoas sozinhos, só nós da Gerência de Saúde Mental.”
Fazem parte da Gerência de Saúde Mental as seguintes unidades: Espaço Crescer (para pacientes de 3 a 18 anos), Centro de Atenção Psicossocial “Dr. Nelson Fernandes Júnior” (Caps 2, para pacientes adultos, a partir de 18 anos, com transtornos graves e crises), Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas “Dr. Calil Buainain” (Caps-AD, para pessoas com problemas de abuso de substâncias) e Centro de Referência de Saúde Mental do Adulto de Araraquara “Dr. Ubirajaras Caldas” (Crasma-A, para adultos com transtornos leves e pacientes estabilizados).
Gislaine observou que a internação é a última alternativa para o cuidado dos pacientes. “Antes disso, a gente tem que cuidar do paciente na questão do ambulatório, na atenção básica, no território. A gente quer dar ao paciente de saúde mental o direito de ser cuidado como todas as pessoas são cuidadas. A internação é necessária? Muitas vezes sim. Mas ela não pode ser a primeira opção de cuidado.”
E o que leva uma pessoa a tirar a própria vida? As causas do suicídio foram exploradas pela psiquiatra Katia Comito, que atua no Caps 2. Ela iniciou sua explanação mostrando a evolução de notificações de suicídios de 2010 (quando foram 6) a 2023 (que foram 57), segundo dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde. O aumento é constante a partir de 2015. “É um número absurdo para uma cidade como Araraquara”, avaliou a médica. “Se pensarmos na subnotificação, na verdade esses 57 não são reais, pois há acidentes de trânsito, overdoses, diabetes não tratados que são suicídios e não saem como suicídios. Não sabemos exatamente nem o número de suicídios nem de tentativas.”
Katia explicou que o suicídio é multifatorial, envolvendo problemas emocionais, patologias psiquiátricas, patologias clínicas e questões familiares, sociais, econômicos e culturais. “O suicídio é dor”, declarou. “Com certeza, ele não é covardia, coragem, fraqueza, frescura, falta de fé, loucura ou falta de amor por quem ficou. A pessoa que resolve tirar a própria vida, está em uma dor intensa e quer acabar com ela.” Por isso, ela aconselhou a observar nos familiares, amigos e em nós mesmos aspectos como: mudanças de humor, temas das conversas, redes sociais frequentadas, aumento de isolamento, alterações de sono e apetite e adesão a tratamentos clínicos ou psiquiátricos. Ela elencou ainda uma série de fatores de risco: doença e/ou morte de familiar, suicídio de familiar ou pessoa próxima, separação, perda de emprego, violência doméstica, violência vivida pessoalmente ou presenciada, assédio sexual ou moral, mudança de cidade ou país, preconceito, bullying, instabilidade econômica, catástrofes ambientais, epidemias/pandemias e guerras.
Para a psiquiatra, um problema que vem afetando o aumento dos casos de suicídio é o isolamento contemporâneo: “Ninguém ouve, ninguém vê e ninguém convive com ninguém, mesmo dentro da própria casa. A gente está sozinho e, quando está sozinho, a gente não dá conta de lidar com os sentimentos do dia a dia”. Por isso, ela aconselhou os presentes a escutarem uma pessoa que está precisando de ajuda sem preconceito, sem julgamento e sem críticas. “Muitas vezes, só escutar e chorar junto já ajuda muito”, afirmou, lembrando que é responsabilidade do governo, em todos os níveis, proporcionar espaços de escuta e preparar os profissionais que trabalham nesses espaços.
Katia também falou dos caminhos da prevenção, citando atendimento médico, psicológico, interdisciplinar, assistência social, educação, esporte, lazer, cultura, religiosidade e locais de proteção, como os Centros Afro, de Referência da Mulher e LGBTQIA+. Ela lembrou ainda da pósvenção, isto é, o cuidado das pessoas que perderam alguém querido para o suicídio. “Todo luto é um processo humano, natural e saudável, que nos leva a crescer, mas precisamos acolher a pessoa num primeiro momento, porque a tendência é que ela se sinta culpada, impotente, desamparada e com muitos outros sentimentos com os quais ela não sabe lidar. Além disso, é comum que se faça silêncio sobre a pessoa, sobre o que aconteceu, ninguém fala mais, vira um fantasma no coração de cada membro da família. É importante cuidar emocionalmente dos familiares e amigos”, acrescentou.
O público presente participou com relatos pessoais sobre problemas de saúde mental nas próprias famílias, além de contribuições de profissionais que também lidam com essas questões, como o sargento Marcel dos Santos, do Corpo de Bombeiros, o corregedor Reginaldo Luís Bolato, da Guarda Civil Municipal, e o professor Marinaldo Fernando de Souza, da Unip.
Estiveram presentes também as gestoras dos equipamentos de saúde mental: Rosana Filipi (Espaço Crescer), Glaucia Cristina Harteman (CAPS 2), Stella Figueiredo (CAPS AD) e Silvana Onofre (Crasma).
A Audiência Pública pode ser assistida na íntegra neste link.
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