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Um divórcio com a realidade. Assim o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT), Rafael Araújo Gomes, definiu a possível aprovação do Projeto de Lei nº 4.330/2004, que regulamenta contratos de terceirização no mercado de trabalho. A proposta que prevê a contratação de serviços terceirizados para qualquer atividade desde que a contratada esteja focada em uma atividade específica passou na Câmara dos Deputados em abril – após 10 anos de tramitação – e será votada pelo Senado. Em um discurso de 35 minutos durante a audiência pública sobre o tema realizada na noite de quarta-feira no plenário da Câmara, Gomes afirmou que, se aprovada, a Lei da Terceirização terá consequências extremamente nocivas aos trabalhadores do País, como salários mais baixos, aumento de acidentes de trabalho, maior incidência de trabalho escravo, culminando em um completo caos social. O procurador atribuiu a culpa desse previsto “apagão social” à elite econômica e política “míope e burra”, que só visa à “redução de custos e lucro mais fácil”. “Eles não percebem que a preservação dos direitos trabalhistas é interesse de todos”, completa o procurador.
Ele afirmou ainda que a lei que vem sendo discutida desde 2011 por deputados e representantes das centrais sindicais e dos sindicatos patronais é um “veneno para a produtividade” e gera empresa sem qualificação e sem segurança. Para ilustrar seus argumentos, com base em sua experiência no MPT, citou exemplos de fraudes e problemas trabalhistas em vários setores na região, inclusive com “terceirizadas em nome de laranjas”. Um dos casos envolveu uma terceirizada do setor de vigilância cujos proprietários desviaram recursos da empresa, fecharam as portas e sumiram, deixando funcionários sem pagamentos por até três meses. Em outros, o MPT investigou terceirizadas que atuavam em setores como Saúde Pública, Processamento de cana de açúcar, Transporte ferroviário, entre outros. Houve até uma empresa de segurança que, por meio de averiguação dos armamentos, descobriu-se ligação com o crime organizado.
Requerida pela bancada petista na Câmara, a audiência pública que discutiu o Projeto de Lei da Terceirização e suas consequências contou com ainda com a presença dos vereadores Elias Chediek (PMDB), presidente da Câmara de Araraquara, e Donizete Simioni (PT), Milton Bolini, gerente regional do Ministério do Trabalho e Emprego em Araraquara, Paulo Roberto Redondo, presidente do Sindicato dos Bancários de Araraquara, João Milani Veiga, presidente da 5ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Araraquara, Vanderlei Aparecido Strano, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, representando a CUT – São Carlos, além de trabalhadores e representantes de sindicatos, sobretudo dos bancários, metalúrgicos e da saúde.
Representantes dos trabalhadores argumentam que a lei pode provocar precarização no mercado de trabalho. Empresários, por sua vez, defendem que a legislação promoverá maior formalização e mais empregos. Mas nenhum representante pró-aprovação compareceu à audiência. “Não é um debate. São colocações sobre o mesmo lado. Não há antagonistas”, lembrou Bolini. O gerente regional do Ministério do Trabalho citou ainda alguns pontos problemáticos da concepção do PL da Terceirização, sobretudo no rol de direitos subtraídos do trabalhador, e discorreu sobre “o que está por trás” deste projeto de lei. Veiga exemplificou o impacto negativo da terceirização com o que ocorre em condomínios, setor em que os trabalhadores (faxineiros, porteiros etc.) são comumente terceirizados e cujas categorias relacionadas sofreram redução de cerca de 30% no salário.
Polêmica
O PL 4.330/04 envolve quatro grandes polêmicas, que têm causado protestos das centrais sindicais: a abrangência das terceirizações tanto para as atividades-meio como atividades-fim; obrigações trabalhistas serem de responsabilidade somente da empresa terceirizada – a contratante tem apenas de fiscalizar; a representatividade sindical, que passa a ser do sindicato da empresa contratada e não da contratante; e a terceirização no serviço público. Hoje só é permitido terceirizar as atividades-meio ou apoio das empresas, ou seja, pessoal da limpeza, recepção, telefonia, segurança e informática, por exemplo. A proposta divide opiniões entre empresários, centrais sindicais e trabalhadores. Os empresários argumentam que o projeto pode ajudar a diminuir a informalidade do mercado. Segundo o presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), Paulo Skaf, a lei pode representar a geração, no futuro, de 700 mil empregos/ano em São Paulo e mais de 3 milhões no Brasil. Já representantes dos trabalhadores acreditam que a aprovação do projeto de lei pode levar a uma precarização das condições de trabalho. Entre as queixas mais recorrentes daqueles que trabalham como terceirizados estão a falta de pagamento de direitos trabalhistas e os casos de empresas que fecham antes de quitar débitos com trabalhadores.
Um em cada quatro trabalhadores é terceirizado
O Ministério do Trabalho não tem números oficiais de terceirizados no país. De acordo com um estudo da CUT em parceria com o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), o total de trabalhadores terceirizados em 2013 no Brasil correspondia a 26,8% do mercado formal de trabalho, somando 12,7 milhões de assalariados. Os estados com maior proporção de terceirizados, segundo o estudo, são São Paulo (30,5%), Ceará (29,7%), Rio de Janeiro (29,0%), Santa Catarina (28%) e Espírito Santo (27,1%), superior à média nacional de 26,8%. A regulamentação da terceirização beneficia as empresas contratantes em quatro pontos principais. Uma delas é que gera maior competitividade e simplifica o processo produtivo, pois passa para a responsabilidade da terceirizada as atividades que não são as principais da empresa. A regulamentação dá maior segurança jurídica entre as empresas e diminui custos com ações trabalhistas.
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